SPFW: a história da maior semana de moda brasileira
A edição N54 do principal evento da indústria nacional acontece de 16 a 20/11 e, pela primeira vez, com venda de ingressos. Confira a história da fashion week e alguns pontos altos dos 27 anos de trajetória
Em 1993, o produtor Paulo Borges, em parceria com a empresária Cristiana Arcangeli, criou o Phytoervas Fashion, a semente do que viria a ser o São Paulo Fashion Week anos depois. O evento aconteceu em um galpão na Vila Olímpia, zona oeste de São Paulo, por três dias e com nove desfiles ao total. Estilistas – hoje veteranos – como Alexandre Herchcovitch, Fause Haten e Glória Coelho foram alguns dos que se apresentaram.
“Foi a primeira incubadora de moda no mundo, que apoiava e investia naqueles estilistas, na produção de suas coleções. Grandes nomes nasceram ali”, declara Paulo Borges em uma palestra à rede de empreendedores Endeavor Brasil. Em 1994, por exemplo, Alexandre Herchcovitch, provavelmente o estilista brasileiro mais conhecido no país, apresentou na passarela do evento a sua clássica estampa de caveira pela primeira vez.
Até então, o Brasil não tinha uma semana de moda e grande parte da produção de vestuário nacional era diretamente espelhada nas coleções europeias. A intenção era fomentar a produção nacional, mas o cenário econômico e político trazia instabilidades. No ano anterior, o presidente Fernando Collor passou por um impeachment e o PIB havia recuado 0,5% (IBGE).
Apesar do contexto, o Phytoervas Fashion se desdobrou em oito edições. Em 1996, Paulo Borges se desligou de Cristiana Arcangeli, criadora da marca Phytoervas. A sua própria empresa, o Grupo Luminosidade, criou uma nova parceria com o Shopping Morumbi, dando início ao Morumbi Fashion Week.
“A saída do Phytoervas Fashion foi marcante. Naquele momento, eu sabia que tinha uma causa na minha vida, a moda, uma coisa que ninguém acreditava, nem mesmo a imprensa”, afirmou Paulo Borges. “O Brasil pouco reconhecia e reconhece (a moda) em termos de plano de estado, como uma indústria que tem mais de 30 mil empresas.”
O produtor explica que a Phytoervas tinha o intuito de investir no aspecto de entretenimento do evento, enquanto o seu objetivo era mais mercadológico, de organizar e estruturar a indústria. “Todo mundo que já era grande, como a Zoomp, Fórum, Maria Bonita e Reinaldo Lourenço, queria fazer uma ‘Semana de Moda’ no Brasil. Foi aí que eu rompi com a Phytoervas”, explica.
Calendário oficial
O movimento deu certo e a escala aumentou; de 30 a 40 desfiles por edição. Cristiana Arcangeli, no ano seguinte, transformou o seu projeto em uma competição: o Phytoervas Fashion Award, que premiava estilistas, publicitários, jornalistas e outros profissionais. A übermodel Gisele Bündchen, por exemplo, ganhou o prêmio de melhor modelo em 1998, o segundo e último ano do evento.
Por sua vez, o Morumbi Fashion Week seguiu forte e foi estabelecido como o calendário oficial da moda no Brasil. “Cada um lançava as coleções em um período do ano e isso era oneroso e pouco visível para quem comprava. Para a imprensa, então, não tinha visibilidade”, declara Paulo Borges. Ou seja, os compradores começaram a se planejar para os períodos de aquisição, assim como a imprensa, que passou a olhar para a produção. O mercado começou a funcionar, então, em uma mesma engrenagem.
Em 1999, o canal televisivo estadunidense E! Entertainment passou a cobrir o evento e a supermodelo britânica Kate Moss desfilou para Ellus. O contexto do final dos anos 90 foi marcado pelo ingresso de grifes e maisons no país, como Chanel, Gucci e Versace, o que acelerou a indústria têxtil nacional ao projetar confiança.
Houve também, neste período, a maior profissionalização dos integrantes do mercado, de estilistas e produtores às agências e modelos. Nomes como Shirley Mallmann, Gisele Bündchen, Isabeli Fontana e Adriana Lima já tinham destaque dentro e fora do Brasil.
Novo milênio
Em 2001, o evento passou a se chamar São Paulo Fashion Week. Neste mesmo ano, o estilista Ronaldo Fraga fez uma homenagem a Zuzu Angel, que ganhou fama ao questionar, em seus desfiles, o sumiço do filho Stuart e as violências do período da Ditadura Militar no Brasil. A coleção de Ronaldo foi premiada pela Associação da Indústria Têxtil.
Neste mesmo ano, o site oficial do SPFW fez a transmissão ao vivo do evento pela primeira vez. “A gente criou um sistema sustentável, bom para todo o mercado. É bom para quem produz, apresenta, compra e vende moda”, opina Paulo Borges. “A gente percebeu muito cedo que precisava se organizar para alcançar o Brasil inteiro porque 95% de tudo que produzimos (de moda) é para o mercado interno.”
A São Paulo Fashion Week sempre trouxe temáticas relacionadas à identidade e cultura nacionais. Em 2002, o tema de uma das duas edições anuais foi “Moda Brasileira por Brasileiros”. Já no ano seguinte, o evento homenageou a diversidade das modelos brasileiras. Saltando para 2009, o SPFW exibiu figurinos da artista Carmen Miranda, em homenagem ao seu centenário.
Rostos e desfiles marcantes
O SPFW se estabeleceu como o evento mais importante de moda do Brasil e da América Latina. A semana de moda chegou a receber uma média de 2 mil jornalistas e blogueiros credenciados a cada edição e foi considerada a quinta maior semana de moda do mundo, atrás de Paris, Milão, Nova York e Londres.
As passagens de muitas personalidades marcaram a história e ajudaram a impulsionar o evento. Entre os nomes que cruzaram as passarelas, talvez o de Gisele Bündchen, nos anos em que desfilou para a Colcci, tenha sido o mais importante em relação à atração midiática.
Com foco nos desfiles, além da apresentação de 2002 de Ronaldo Fraga inspirada em Zuzu Angel, muitas foram as coleções que entraram para a história. Em 2008, a Cavalera, sob o comando de Alberto Hiar, fez seu desfile de inverno às margens do Tietê, exatamente no Cebolão, onde este rio e o Pinheiros se encontram. Os jornalistas assistiram à apresentação de um barco enquanto as modelos desfilaram nas laterais de concreto com looks românticos e inocentes, em oposição ao cenário duro e poluído.
Um pouco antes, em 2004, o estilista Jum Nakao passou aproximadamente 700 horas trabalhando com roupas de papel. Ao término do desfile, as peças foram rasgadas na passarela. No mesmo ano, Alexandre Herchcovitch transformou correntes em acessórios na coleção de inverno em homenagem a Zé do Caixão. Em 2009, Glória Coelho apresentou uma de suas coleções mais marcantes: uma espécie de viagem espacial com looks futuristas e volumes arquitetônicos, com um paralelo com as criações de Cristóbal Balenciaga.
Mais recentemente, a estreia de Isaac Silva no SPFW, em 2019, levou à passarela looks monocromáticos brancos, usados por modelos diversas em tom de pele, identidade de gênero e tamanho. Sob o lema “Acredite no seu axé”, a coleção foi uma das mais marcantes do ano.
Diversos outros momentos e ações delinearam a história do evento, como a adoção de cotas raciais (afrodescendente, asiática e indígena), obrigatória nos desfiles desde 2020, e a adoção do modelo See now, buy now (“Veja agora, compre agora”, em tradução livre), que deixou de lado a nomenclatura “primavera/verão” e “outono/inverno” e viabilizou o ingresso quase que imediato das coleções ao público, logo após o desfile.
Em 2017, foi criado o Projeto Estufa no SPFW, uma plataforma que se volta, com desfiles e apresentações, às experimentações criativas e ao estímulo de novos nomes da indústria. O projeto gira em torno de pautas como sustentabilidade, consumo, responsabilidade social e tecnologia.
O SPFW N50 em 2020, em comemoração aos 25 anos do evento, foi completamente digital por conta da pandemia de covid-19. Ao total, duas edições se deram inteiramente online. Em 2021, o evento assumiu o formato híbrido.
O que esperar da próxima edição?
O SPFW N54 acontece de 16 a 20 de novembro e tem como tema “IN.PACTOS”. Pela primeira vez desde o início da pandemia, a maior parte dos desfiles será presencial: 43 em comparação às cinco apresentações digitais.
O evento, sediado no Komplexo Tempo, na Mooca, tem ainda outra novidade: o público geral poderá assistir e conferir os desfiles mediante a compra de ingressos. Os convites, disponibilizados à venda no final de outubro, custavam entre R$ 100 e R$ 1,5 mil.
Confira o line-up:
Quarta 16/11
12H00 Patrícia Viera
16H00 Meninos Rei
17H00 Soul Basico
18H00 Greg Joey
19H00 Walério Araújo
20H00 Renata Buzzo
20H30 Aluf (Digital)
21H30 Bold Strap
Quinta 17/11
10H30 Misci
12H30 Lilly Sarti
13H00 Relow
16H00 DePedro
17H00 Sou de Algodão
18H00 TA Studios
19H00 Another Place
20H00 Buzina
20H30 Modem (Digital)
21H30 João Pimenta
Sexta 18/11
10H30 A.Niemeyer
12H00 Triya
14H30 Lino Villaventura
16H00 Rocio Canvas
17H00 Thear
18H00 Ateliê Mão de Mãe
19H00 Martins
20H00 Handred
20H30 Heloisa Faria (Digital)
22H00 Ellus
Sábado 19/11
10H30 Angela Brito
12H30 Neriage
15H00 AZ Marias
16H00 Ponto Firme
17H00 Silvério
18H00 Santa Resistência
19H00 Anacê
19H30 Àlg (Digital)
20H00 LED
21H30 Lenny Niemeyer
Domingo 20/11
10H00 Korshi 01
12H00 À La Garçonne
15H00 Isaac Silva
16H00 Cria Costura
17H00 Lucas Leão
18H00 Naya Violeta
19H00 Weider Silveiro
20H00 Dendezeiro
20H30 Maurício Duarte (Digital)
21H30 Apartamento 03