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Fantasmas no Copan: moradores de prédio icônico do Centro de SP catalogam ‘vizinhos sobrenaturais’

Moradores e funcionários citam vultos, barulhos em escada, elevador descontrolado e até uma aparição no terraço do prédio. Nas últimas semanas, relatos viralizaram nas redes sociais.

Por Deslange Paiva e Luiz Franco, g1 SP

“Psiu”, “Homem da Casa das Máquinas”, “Conchinha” e até um elevador temperamental… É tão grande a quantidade de relatos sobre supostos fantasmas (isso mesmo) no Copan, icônico edifício no Centro de São Paulo, que os moradores começaram a catalogar e dar nomes às aparições.

Nas últimas semanas, viralizaram nas redes sociais relatos de moradores do emblemático prédio projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer, que abriga mais de 5 mil pessoas. Os posts citavam, por exemplo, odores sem explicação e tramas sobrenaturais. Também se lembraram de uma história impactante narrada, ainda em 2019, pelo ator e comediante Paulo Vieira, que mora lá.

g1 ficou intrigado com os casos e decidiu visitar o local para saber mais sobre os tais fantasmas do condomínio, inaugurado em 1966 e tombado como patrimônio da capital paulista.

👻 Como as histórias se propagam? Moradores do Copan usam grupo no WhatsApp para tirar dúvidas do dia a dia, organizar doações e, claro, compartilhar supostas aparições de fantasmas.

😱 Quais seriam os fantasmas em ação? Neste grupo, estão catalogadas figuras como o “Psiu”, o “Homem da Casa das Máquinas”, os vultos do 7º andar e o elevador temperamental. (O assunto sempre retorna à pauta do dia quando alguém tem uma experiência inusitada.)

🆘 O que as figuras sobrenaturais fazem? Moradores e funcionários falam em “perseguição” na garagem e sensação de que estão sendo esganados (como se houvesse alguém apertando a garganta das “vítimas”), barulhos na escada e até uma aparição no terraço do prédio.

💸 Essas aparições teriam um lado, digamos, positivo? Na visão de alguns moradores do Copan, a existência de fantasmas deveria ser estimulada para o preço do aluguel baixar.

💭 E o que o Paulo Vieira contou em 2019, afinal? O ator narrou um sonho assustador no qual o apartamento dele era alvo de uma tentativa de invasão cometida por uma vizinha até então desconhecida. Segundo o artista, ao acordar no dia seguinte, e notar uma movimentação no corredor de seu andar, ouviu de um policial: “Sua vizinha se matou” (leia mais ao final desta reportagem).

E como é o Copan?

  • O Edifício Copan foi projetado em 1950 por Oscar Niemeyer, com colaboração de Carlos Lemos, e inaugurado em 1966.
  • Há atualmente 1.160 apartamentos, com mais de 5 mil moradores.
  • Apesar dos sustos e das aparições, quem vive no Copan diz que não quer sair de lá por nada. Moradores ouvidos pelo g1 classificam o local como “uma cidade dentro da cidade”.
  • No condomínio, há bares, restaurantes, salão de beleza, floricultura e aquela que é citada como a “menor fábrica de chocolate do mundo”.
  • Ao todo, são seis blocos com 19 tipologias de apartamentos: nos blocos C e D, ficam as grandes unidades; no bloco A, as medianas; e nos blocos B, E e F ficam as de um quarto ou quitinetes.
  • O bloco B é o que tem mais apartamentos, com 640 unidades.
  • Cada bloco tem três elevadores: dois sociais e um de serviço.

“Morar aqui é algo que eu sempre quis. Além da comodidade de morar no Centro, é simplesmente o lugar ideal para quem trabalha com arte, como é meu caso. Todos os moradores daqui são bem excêntricos”, descreve a tatuadora Julia Zaia, que vive no Copan há dois meses.

“Além disso, existe uma ideia de comunidade que não deve existir em nenhum outro lugar de São Paulo, eu tenho impressão de que, se você precisar de alguma coisa, alguém aqui vai ter para te dar.”

⚠️ ‘Homem da Casa das Máquinas’

“A história é real, não é brincadeira. Eu tinha um mecânico chamado Longo. Uma noite, na casa de máquinas do bloco E, ele viu uma pessoa sentada em uma das máquinas e saiu correndo. Depois, conversou comigo e disse que nunca mais voltaria para cuidar do prédio à noite”, afirma Affonso Celso Prazeres de Oliveira, síndico do prédio há 30 anos.

Affonso vive no Copan desde 1963 e, 30 anos depois, foi chamado para assumir a administração do edifício. Ele próprio diz que nunca viu o tal “Homem da Casa das Máquinas”, mas a história corre entre os funcionários.

“Isso aconteceu há quase 20 anos. Em outra ocasião, ele [Longo] voltou para o conserto de uma máquina, mas acompanhado de outro mecânico. Enquanto o Longo foi ao banheiro, o outro mecânico apareceu correndo porque tinha visto o homem”, conta o síndico.

“Os dois voltaram no local, e ele estava lá sentado. Dizem que esse Homem da Casa das Máquinas um ex-morador que ajudou na construção do prédio. Ele até chegou a trabalhar comigo.”

Affonso, síndico do Copan.  — Foto: Luiz Franco/ g1

Affonso, síndico do Copan. — Foto: Luiz Franco/ g1

🚨 Estratégia de mercado

“A gente tem mais benefícios do que malefícios com os supostos fantasmas. Tem todo um entorno do Copan, vantagens de se viver aqui. Não é um fantasminha que vai fazer a gente se mudar”, brinca o roteirista Miller da Silva dos Santos.

“Eu faço minha parte. Tenho o José Carlos Pagode [um gato], o Zeca Pagodinho, para limpar as energias. Mas, tendo ou não fantasmas aqui, eu acho legal fomentar a ideia, porque o aluguel no Copan está muito caro. Então, se baixar vai ser vantajoso pra gente.”

Miller mora no Copan há três anos e tem sustos constantes com o elevador do bloco B.

“Eu sou sempre assombrado pelo elevador. Uma vez apertei o botão do térreo, e o elevador parou em outro andar. Enquanto isso, eu estava me olhando no espelho, e a porta se abriu. Olhei rápido e meio que vi um vulto, mas ninguém entrou. Olhei para fora e não vi ninguém.”

Miller continua: “Na segunda vez em que aconteceu, o elevador foi parar no 15º andar. A porta se abriu e caiu o botão do térreo, que eu tinha apertado. Depois, o elevador simplesmente não fechava. Fiquei meio desesperado nessa hora, porque ele simplesmente resetou, sem querer ir para o térreo”.

Na terceira vez, Miller estava acompanhado de um amigo, o analista de dados Diego de Castro Fernandes, que diz: “O elevador faz uma coisa assustadora às vezes, sempre para em um andar em que ninguém apertou, a porta se abre e, quando vai fechar, fica indo e voltando, como se tivesse alguém bloqueando a passagem. Isso já aconteceu até quando estávamos juntos”.

“Quem morou neste apartamento aqui foi a Elke Maravilha. Muitas pessoas moraram aqui na década de 1980. Acho que a grande maioria dos fantasmas, se a gente realmente tiver, é a galera boêmia. Então, a gente não tem que ter medo”, afirma Miller.

O roteirista Miller e o gato Miller da Silva dos Santos — Foto: Luiz Franco/ g1

O roteirista Miller e o gato Miller da Silva dos Santos — Foto: Luiz Franco/ g1

🤫 ‘Psiu’, ‘Conchinha’ e odores no bloco B

“Eu estava descendo as escadas e escutei bem no pé do ouvido um: ‘psiu’. Fiquei muito assustada, achei que era um funcionário. Olhei, não vi ninguém. Voltei a descer as escadas e escutei de novo, bem no pé do ouvido. Virei com tudo e vi meio que um vulto, achei que era alguém brincando com a minha cara, mas subi as escadas e não vi ninguém”, diz a tatuadora Julia Zaia.

“Sou bem cética quanto a isso e tentei me convencer de que era uma alucinação até me colocarem no grupo dos moradores e pipocarem mais relatos.”

Ela tem um estúdio de tatuagem no 24º andar e, após terminar um relacionamento, precisou encontrar um novo lugar para morar. “Como já tinha o aluguel do estúdio, pensei em dormir aqui como uma forma de economizar grana.”

Julia deu de cara com o “Psiu” logo na primeira semana em que estava dormindo no local.

A tatuadora Julia Zaia, moradora do Copan — Foto: Luiz Franco/ g1

A tatuadora Julia Zaia, moradora do Copan — Foto: Luiz Franco/ g1

Natasha Costa, de 24 anos, passou por uma situação parecida: conheceu o “Conchinha” na primeira noite que passou no prédio.

“Sou bastante cética, mas tive uma ‘experiência’ na minha primeira noite morando no Copan. Estou aqui há poucos meses, em um apartamento no 21º andar. Basicamente, acordei com alguém me abraçando quando eu estava dormindo, por volta de 10h30. Me assustei obviamente, e a ‘pessoa’ fez um ‘shhh’ no meu ouvido”, lembra.

“Primeiro pensei que era meu marido, mas não tinha ninguém em casa. Acordei com o contato da ‘pessoa’. Fiquei por alguns segundos acordada com o abraço, depois simplesmente parou.” Natasha apelidou o fantasma de “Conchinha”.

“O Conchinha nunca mais voltou. Isso rolou só uma vez, mas, se acontecesse de novo, eu provavelmente me mudaria.”

Em uma rede social, um outro morador, também do bloco B, contou a história de uma vizinha que morreu em 2019. Ela era conhecida no prédio por ter muita higiene. Após a morte dessa mulher, foi feita uma limpeza no apartamento. Mas, atualmente, em alguns dias da semana, esse morador ainda sente o cheiro da vizinha no corredor, como se ela estivesse caminhando pelo local.

📜 ‘Este prédio tem história’

José Roberto trabalha no Copan há mais de 37 anos. Começou como faxineiro, virou vigia, depois segurança, gerente e, finalmente, passou a ser um dos encarregados do edifício.

“Na época [em que começou], eu estava desempregado e resolvi encarar como algo temporário, agora corta para 37 anos depois, continuo aqui”, lembra.

Há 12 anos, José estava fazendo uma ronda no terraço do prédio, por volta de 19h30, quando viu um vulto próximo à escada de incêndio do bloco F.

“Vi uma pessoa saindo da escada de emergência, aumentei o passo. De primeiro, achei que era alguém tentando me dar um susto. Olhei todos os portões e, quando cheguei na escada, cadê a pessoa? Cara, fiquei arrepiado, apressei o passo, olhei todos os cantos e não achei nada.”

“Desde que isso aconteceu, comecei a acreditar [em fantasmas]. Sempre que subo aqui, faço a ronda apressada. Este prédio tem história. Existe, existe mesmo, pelas histórias durante a construção desse prédio, teve muitas mortes de trabalhadores. Naquela época, não tinha toda a segurança que hoje tem. Então, são coisas que a gente vê. Podem ser lendas, mas eu não duvido.”

José Roberto, funcionário do Copan — Foto: Luiz Franco/ g1

José Roberto, funcionário do Copan — Foto: Luiz Franco/ g1

Um funcionário da área administrativa do prédio, que prefere não ser identificado, afirmou que o irmão chegou a ter uma sensação de que estava sendo esganado enquanto descansava no local.

“Eu não duvido de nenhuma maneira. Meu irmão faz o turno da noite aqui, em uma dessas noites ele foi para a sala de descanso dos funcionários, onde tem uma rede. Ele se deitou e foi sufocado, ele conseguiu se soltar, olhou em todos os cantos procurando quem tinha feito isso, mas não achou ninguém”, afirma.

🧹 ‘Limpeza de energia’

Gato Zeca Pagodinho — Foto: Luiz Franco/ g1

Gato Zeca Pagodinho — Foto: Luiz Franco/ g1

Acreditando ou não na existência de seres sobrenaturais, moradores dizem que já tiveram sustos o suficiente, o que os levou a adotar o que consideram “medidas de proteção”:

🐈 Ter gatos em casa, que seriam capazes de “limpar energias negativas” do local.

♨️ Acender palo santo.

🕯️ Acender velas.

“Eu sou do Recife. Quando vim para São Paulo, foi a primeira vez em que morei em lugares antigos, que você consegue ver fotos antigas. Então, todo apartamento que entro me lembro que ao menos 50 pessoas já moraram antes de mim”, diz Diego de Castro.

“Vivo aqui há dois anos. O primeiro lugar que escolhi foi no Largo do Arouche, por ser um refúgio LGBTQ+, historicamente. Depois, vim para cá [Copan]”, afirma.

“Sempre mantenho uma vela acesa no apartamento, para proteção, sei lá, para não me sentir sozinho. Muita gente morou aqui, muitas vidas estiveram nesse lugar, o que é normal. Não dá para ter uma ingenuidade de acreditar que só porque você alugou um lugar ele é seu. Acho que você tem que chegar em um lugar e deixar mais limpo do que o encontrou.”

Diego Fernandes, morador do Copan.  — Foto: Luiz Franco/ g1

Diego Fernandes, morador do Copan. — Foto: Luiz Franco/ g1

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📢 Relato ‘antigo’ de Paulo Vieira

Em 2019, o humorista contou o seguinte no Twitter:

“Um dia eu tive o seguinte sonho: eu estava dormindo e acordei com alguém tentando entrar no meu apartamento, a pessoa estava forçando a maçaneta. Abri a porta e era minha vizinha de frente (que eu nunca tinha visto, mas no sonho eu sabia que era ela). Eu disse ‘cê tá tentando entrar no meu apartamento? Quê que você tá fazendo?’, ela estava transtornada (parecia drogada) e disse ‘não sei, não sei, eu não sei… eu não sei quê que eu tô fazendo… quê que eu tô fazendo?’. Ela colocou a mão na cabeça e saiu meio desesperada”.

Segundo Paulo, no dia seguinte, quando se preparava para sair, havia uma movimentação de pessoas e policiais no corredor do seu andar. “Perguntei ‘o que aconteceu’ e o policial respondeu ‘sua vizinha se matou'”.

O ator afirmou que, para passar pelo “luto”, compôs uma música para a vizinha que nunca chegou a conhecer.

🏙️ Uma cidade dentro da cidade

Edifício Copan, no Centro de SP, é ponto principal de gangue de bicicletas que rouba celulares — Foto: Reprodução/TV Globo

Edifício Copan, no Centro de SP, é ponto principal de gangue de bicicletas que rouba celulares — Foto: Reprodução/TV Globo

Relatos nas redes sociais

Veja, a seguir, posts de moradores falando sobre fantasmas:

Moradores falando sobre fantasmas em grupo de troca de mensagens.  — Foto: Reprodução

Moradores falando sobre fantasmas em grupo de troca de mensagens. — Foto: Reprodução

Moradora perguntando sobre fantasmas no grupo do WhatsApp. — Foto: Reprodução

Moradora perguntando sobre fantasmas no grupo do WhatsApp. — Foto: Reprodução

  • Inicialmente, o projeto original previa a construção de um prédio residencial com 30 andares e outro que abrigaria um hotel com 600 apartamentos, que teria uma laje ligando os dois prédios e sustentando um restaurante, além de piscina, galeria de lojas, jardins suspensos e garagens subterrâneas, mas somente o residencial foi construído.
  • A conclusão do edifício residencial levou 15 anos, do início da década de 1950 até meados da década de 1960.
  • Ao longo dos anos, as mudanças no projeto foram tantas, que Niemeyer perdeu o interesse no que ele mesmo planejou, e a execução foi entregue ao arquiteto Carlos Lemos.
  • A parte interna do edifício foi totalmente alterada, apenas a parte externa foi mantida como Niemeyer projetou.

Há pelo menos uma década, o prédio projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer convive com problemas de manutenção da fachada, como infiltrações e queda de pastilhas. Todos esses elementos foram constatados em laudos e denunciados a órgãos do patrimônio histórico.

Em 2021, o projeto de reforma foi aprovado com o Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental de São Paulo (Conpresp).

Atualmente, o prédio continua com uma espécie de lona por conta da queda de pastilhas, segundo o síndico do local, a conclusão da reforma deve ocorrer nos próximos três anos.

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