Moradoras de prédios tortos no litoral de SP abrem as portas de casa e contam curiosidades; VÍDEO
Levantamento feito pela Prefeitura de Santos (SP) revelou que são 319 edifícios nessa situação, sendo que 65 que estão em frente às praias apresentam maior inclinação.
Por Brenda Bento, g1 Santos
Você já imaginou como é a vida dentro de um prédio torto? O g1 conversou, nesta sexta-feira (22), com duas moradoras de Santos, no litoral de São Paulo, que moram em edifícios inclinados na orla da praia. Elas falaram sobre a experiência de viver nesses imóveis que chamam a atenção de quem visita a cidade. Entre as curiosidades citam a sensação de tontura e problemas com as portas.
Um levantamento feito pela Prefeitura de Santos revelou que a situação é observada em outras partes da cidade, não apenas na orla. Ao todo, são 319 edifícios nessas condições, sendo que os 65 em frente às praias apresentam maior inclinação.
A aposentada Maria Isabel Ponce, de 60 anos, disse que mora há 47 em um dos prédios tortos na Avenida Vicente de Carvalho, no bairro Boqueirão, e já se acostumou com a situação. “Aqui é bom de se viver […]. Tem uma vista maravilhosa e isso é o bom de morar aqui. Você pode ver quatro cidades, tudo ao mesmo tempo”.
Maria Isabel disse que ter uma vista de frente ao mar é o ponto positivo em morar no prédio torto — Foto: Reprodução/TV Tribuna
A moradora e síndica de um dos prédios tortos na Avenida Bartholomeu de Gusmão, no bairro Boqueirão, Maria Inês Chedid, de 59 anos, disse que para eles a situação é normal. “A gente se acostuma né? Só tem um pouco de inclinação, as portas fecham sozinha e a bolinha sai rolando”.
Para Inês, a vista para o mar é um dos principais fatores que tornam a situação agradável. “O local é muito bom, a gente tem a vista para o mar, o jardim que é maravilhoso. Isso ajuda a superar a lembrança de que o prédio é torto”.
Tontura, portas que se fecham e desvalorização
Adaptada com a situação, Isabel relembrou que quando mudou-se para o apartamento não percebeu que era torto. “Foi só depois de alguns dias, enquanto tentávamos abrir a porta [do guarda-roupa que percebemos]. Fui me acostumando, mas no início não era fácil”.
Inês ressaltou que os moradores usam prendedores para evitar que as portas fechem sozinha. “O caimento do prédio é para o lado do canal, onde é mais torto”. Ela disse que os episódios de tontura são mais frequentes na saída do elevador. “No dia a dia vamos acostumando, nem se sente mais, o corpo até se adapta”.
Isabel mora no 13° andar de um prédio com 14 andares e contou que já tentou vender o imóvel e acabou desistindo por falta de interessados. “As pessoas dizem que sentem tontura ao entrar aqui, […] sentem um pouco de labirintite, mas eu não sinto nada […]. Até agora não vendi, mas como me acostumei, não irei vendê-lo mais”.
Já Inês acredita que o fato do prédio estar torto não atrapalha no processo de venda. “Pelo contrário, cada dia mais tem gente querendo comprar. Vale muito a pena, não trocamos por nada. Falo por mim e pelos meus vizinhos”.
Inês é dona do apartamento desde 1964, mas este era usado como casa de temporada. Desde 2004 mora no imóvel e convive com a inclinação.
A síndica contou, ainda, que corretores e o engenheiro que acompanha o edifício para elaboração dos laudos estimam que o prédio torto sofra uma valorização entre 40% a 50% com a colocação no prumo — assim que ficar reto.
Conhecido como ‘Prédio do Torto’, a síndica ressaltou a fama do local. “Somos um ponto de referência. Todo mundo para na porta para fotografar. Apesar de não ser o mais torto, como ele é grande chama a atenção”.
O g1 entrou em contato com a Prefeitura de Santos para saber qual é o edifício com maior grau de inclinação, mas a administração municipal disse que não pode informar porque trata-se de propriedade particular que não oferece risco.
Questionada sobre a existência de um levantamento sobre a ocupação desses imóveis tortos, a prefeitura respondeu que não realiza esse monitoramento.
Levantamento
Prédios tortos na orla de Santos (SP) — Foto: Silvio Luiz/A Tribuna Jornal
A análise sobre a quantidade de edifícios tortos em Santos foi realizada por técnicos da Secretaria Municipal de Infraestrutura e Edificações (Siedi) após solicitação apresentada à prefeitura pelo vereador José Teixeira Filho, o Zequinha Teixeira (PP), que inclusive já recebeu ofício com os dados coletados.
Zequinha demandou o Executivo após cobranças da população sobre o tema. “Precisamos saber o aumento do grau de inclinação a cada um ou dois anos, e se isso coloca os moradores em risco”.
De acordo com a prefeitura, apesar de os prédios estarem tortos, as condições atuais deles não indicam comprometimento das seguranças estruturais.
Ao g1, o engenheiro civil Franco Pagani afirmou que nenhum prédio inclinado na cidade apresenta risco de queda, mas explicou que edifícios estreitos e altos demandam maior atenção pois inclinam com mais facilidade, enquanto os grandes e retangulares afundam e não geram perigo.
Lei e laudos por segurança
Santos, SP, tem 65 prédios tortos na região da orla da praia — Foto: A Tribuna Jornal
A Prefeitura de Santos informou que, a cada dois anos, exige que os edifícios apresentem laudos sobre a inclinação dos prédios. O objetivo é acompanhar se aumentou, estacionou e se alguma intervenção deve ser feita.
A cobrança é feita com base na Lei Complementar 441 de 2001, que requer a apresentação de laudo de autovistoria técnica atestando as condições de segurança e estabilidade.
As medições são acompanhadas pelo Programa dos Prédios Inclinados de Santos. A avaliação da necessidade de obras de reparos ou de manutenção da edificação são analisadas pelo responsável técnico pelo laudo.
A prefeitura ressaltou que existem soluções técnicas e viáveis para resolver o problema da inclinação, mas é do condomínio a responsabilidade pela contratação de empresa especializada para execução das obras, enquanto o município fiscaliza.
Prédios tortos na orla de Santos (SP) — Foto: Vanessa Rodrigues/A Tribuna Jornal