Daniel Alves absolvido: veja os argumentos da Justiça para anular condenação por estupro de ex-jogador
Tribunal Superior da Catalunha anulou condenação de estupro do ex-jogador a uma jovem em uma discoteca em Barcelona em 2022. Alves já estava em liberdade provisória. Justiça disse ter visto incosistências na sentença anterior.
Por Luisa Belchior, Poliana Casemiro, g1
A Justiça da Espanha absolveu nesta sexta-feira (28) o ex-jogador brasileiro Daniel Alves da condenção por estupro. Em decisão unânime, o Tribunal Superior da Catalunha decidiu anular a sentença que havia condenado Alves a 4 anos e 6 meses por ter estuprado uma jovem em uma discoteca em Barcelona, na Espanha.
Com a nova senteça, Alves, que foi preso em janeiro de 2023, ficou mais de um ano atrás das grades aguardando julgamento e pagou 1 milhão de euros por sua liberdade provisória, fica totalmente em liberdade e sem nenhuma acusação na Justiça espanhola. Pela sentença anterior, ele ainda teria de cumprir mais de dois anos de prisão.
A decisão de hoje, diz a sentença, não significa que o tribunal esteja afirmando que a versão de Alves — de que não houve estupro e que ele teve uma relação sexual consentida com a vítima — seja a correta. Mas os juízes argumentam que, pelas inconsistências, também não podem aceitar a hipótese da acusação como provada.
O principal ponto em desfavor da vítima na nova decisão é que, diferente da sentença anterior, não haveria como, apenas com o depoimento da vítima, decidir se houve ou não consentimento.
Veja, abaixo, o que os juízes alegaram para tomar a decisão que deixou Alves totalmente livre:
- ‘Falta de confiablidade’
“A decisão recorrida já se referia à falta de confiabilidade do depoimento da autora na parte da história objetivamente verificável, pois se referia a factos registados em vídeo, ‘indicando expressamente que o que ela relatou não corresponde à realidade'”;
- ‘Contraste com outras provas’
A sentença menciona que a versão acusatória (da vítima) sobre a penetração vaginal não consentida não foi adequadamente contrastada com essas provas científicas, que davam suporte à tese da defesa. Com isso, a a sentença anterior aceitou isoladamente a versão subjetiva da vítima sobre a agressão sexual, sem rigoroso confronto com as provas científicas.
“O salto argumentativo dado pela sentença inicial neste ponto, ao adotar a crença subjetiva da declaração da vítima […] ignora o que metodologicamente deveria ter sido investigado pelo tribunal inicial, ou seja, o confronto dessa declaração com as demais provas”.
- Consentimento individualizado
A sentença reconhece que o consentimento sexual pode ser retirado a qualquer momento, porém enfatiza que a comprovação da falta de consentimento deve ser particularmente rigorosa e objetiva.
“Como afirma a sentença inicial, […] a liberdade sexual individual em adultos […] se traduz na faculdade livre de realizar atos de natureza sexual […] de maneira que a liberdade sexual e o consentimento individual são válidos para cada um dos atos dessa natureza realizados, não se admitindo consentimento geral nem posterior”.
- Presunção de inocência:
O tribunal entendeu que as provas apresentadas não superaram o padrão exigido para quebrar a presunção de inocência, exigindo motivação reforçada para condenações.
“Das provas produzidas, não se pode concluir que tenham sido superados os padrões exigidos pela presunção de inocência, conforme a Diretiva (UE) 2016/343 do Parlamento Europeu e do Conselho da Europa de 9 de março de 2016”.
- Credibilidade vs. Fiabilidade
O tribunal esclareceu que a sentença original confundiu credibilidade (subjetiva) com fiabilidade (objetiva e verificável), destacando que o relato da vítima não era suficientemente fiável para sustentar a condenação.
“O que deve ser avaliado em relação ao depoimento para determinar sua fiabilidade é sua veracidade, ou seja, a correspondência entre o que o depoimento contém e o que efetivamente ocorreu, e isso só é possível se existirem elementos objetivos que permitam essa determinação.”
- Insuficiência probatória
A nova decisão reforça que as provas não atendem ao rigor necessário para validar uma condenação penal, destacando que o relato inconsistente da vítima compromete a hipótese acusatória.
“As insuficiências probatórias apontadas levam à conclusão de que não foi atingido o padrão exigido pela presunção de inocência, o que implica a revogação da sentença anterior e o consequente pronunciamento de uma absolvição”.
Os advogados da vítima ainda não haviam se pronunciado até a última atualização desta reportagem.
Tribunal da Espanha absolve o ex-jogador Daniel Alves
Testemunho não ‘confiável’
A decisão que revogou a condenação apontou que o depoimento da vítima apontava discrepâncias com o que havia ocorrido. Segundo o documento foram apontadas:
- Diferença significativa entre o relato da vítima e as imagens das câmeras de vídeo: o tribunal apontou que a versão da vítima sobre fatos, que foram gravados por câmeras de segurança, não correspondia à realidade objetiva registrada nos vídeos, indicando que seu depoimento era inconsistente nesses pontos.
- Negação de uma prática sexual que foi confirmada por exames de DNA: a vítima negou ter praticado um determinado ato sexual, mas as provas biológicas de DNA comprovaram com “alta probabilidade” que essa prática havia, sim, acontecido.
O documento da Justiça a que o g1 teve acesso não especifica exatamente quais fatos relatados pela vítima não foram confirmados pelas imagens. Apenas menciona, de forma geral, que houve discrepâncias graves entre o que ela relatou e aquilo que ficou registrado nas gravações.
O documento também não menciona explicitamente qual foi o ato sexual negado pela vítima, mas confirmado pelos exames de DNA. Apenas afirma que a vítima negou ter praticado um determinado ato sexual, mas as provas biológicas indicaram, com “alta probabilidade”, que esse ato realmente ocorreu.
As quatro versões de Daniel Alves
- Primeiro, Alves tinha negado a relação sexual e qualquer encontro com a jovem. Ele afirmou isso num vídeo enviado ao canal espanhol “Antena 3” há duas semanas, quando as acusações se tornaram públicas;
- Depois, em depoimento à juíza que investiga o caso, ele teria dito que estava no banheiro da boate de luxo “Sutton” quando a mulher entrou, mas que não teve contato algum com ela e que ficou parado, sem saber o que fazer;
- Por fim, admitiu que fez sexo com a suposta vítima, mas garantiu que as relações foram consensuais. De acordo com o “El País”, que ouviu fontes da Justiça espanhola, Alves disse ainda que a mulher se lançou em direção a ele no banheiro para fazer sexo oral. Além disso, acrescentou que ele não tinha dito nada até então sobre isso para “protegê-la”.